quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Aquele episódio do seqüestro relâmpago

Trabalhar numa delegacia de polícia significa lidar com todo tipo de crime.
Ao menos que esteja lotado numa especializada, deve estar sempre preparado para qualquer imprevisto. Em todo caso, o crime não tem pessoa, tipo, local, ou hora certa para acontecer. Simplesmente acontece e, ocasionalmente, a polícia militar consegue pegar o meliante, ainda que isso não signifique que esse sujeito ficará preso.
Justamente num desses tantos plantões em que virei a noite acordado (lembrando que sou um funcionário também do expediente, portanto em jornada dupla), deparamos com um caso em que uma jovem de classe média-alta foi raptada e teve os seqüestradores detidos.
Sem contar a família inteira, a imprensa e mais meia dúzia de advogados, tinha a garota que estava com muitas manchas de sangue pelo corpo. Aquela mulher adentrou na sala improvisada por volta das 3 da manhã, onde prestou seu depoimento. Com o braço direito enfaixado, era notável que os bandidos também lhe removeram um pedaço da orelha esquerda. Cabe aqui destacar que isso tudo ainda parecia coisa de filme hollywoodiano e não uma cena comum, dessas que vejo todo dia.
A jovem contou que, há três dias, por volta das 19 horas, saiu de uma clínica de estética dirigindo seu Chrysler 300C, quando percebeu que estava sendo seguida por um veículo não identificado. Depois de alguns instantes, aquele outro veículo emparelhou ao lado do seu, surgindo, além dele, um motoqueiro pelo lado contrário. No relato, ela disse que eram seis homens, todos encapuzados e portando armas que nunca tinha visto nem nos filmes, dizendo ter sido amarrada, amordaçada e agredida com socos, tapas e chutes. Mencionou que um dos autores assumiu a direção do carro enquanto foi vendada e jogada no banco de trás, ficando com uma arma encostada na cabeça o tempo todo.
A moça contou que foi abusada sexualmente no cativeiro, esclarecendo sobre a forma desumana como foi tratada. Depois de algumas tentativas de negociação sem sucesso, explicou como os seqüestradores resolveram retirar parte da sua orelha e fazer um vídeo, enviando o material para a família que teria de pagar um resgate de meio milhão de reais.
Corajosamente, seu pai resolveu chamar a polícia e então os militares conseguiram invadir o local, resgatando a vítima com vida. Aquilo definitivamente não era algo típico e não deveria ter parado no plantão da nossa delegacia, mas naquele horário, não havia outro lugar disponível para a lavratura e o registro da prisão.
Depois de exaustivas sete horas ininterruptas de interrogatórios, declarações, depoimentos e muito papel assinado, finalmente os bandidos foram entregues no presídio local. E o plantão que deveria durar doze horas já ultrapassava das quatorze. Mas o foco desse texto deveria ser o seqüestro e não as condições insalubres e desumanas de trabalho, que sim, fazem parte da nossa rotina diariamente. Portanto, já que perdi o foco mesmo, registro também a minha indignação com o salário, o ambiente e com o sistema, que insiste em dificultar o máximo possível isso que o estado chama de segurança pública.
Enfim, mais um crime para o julgamento da justiça. Menos um dia de plantão a cumprir.
Claro que não poderia deixar de parabenizar a todos os profissionais que fizeram mais uma vez toda a diferença e cumpriram as leis, salvando a vítima, em meio a incontáveis desafios. Logramos êxito nessa complexa operação que poderia facilmente virar uma história de cinema. Por isso, digo que somos dignos de sermos mencionados como verdadeiros super-heróis.
E só pra constar, eu queria ser o professor Xavier.

Um comentário:

Anônimo disse...

SD PAPA MIKE PIAUI
é por essas e outras - passar do horário sem receber hora extra, salário ridiculo, tratamento humilhante por parte dos superiores - que já nao quero mais nada com a policia. se pudesse pagaria todos os meus serviços e ficaria em casa estudando pra outros concursos. com fe em DEUS saio logo.