Trabalhar como policial não é fácil. Na verdade, nunca foi. Isso porque, por mais simples que pareça, um crime envolve muitas pessoas, procedimentos, punições.
Inevitavelmente, é o tipo de serviço que te torna muito mais insensível, já que ver uma vítima chorar depois do trauma de um estupro, outra testemunha temer a perseguição por dar um depoimento revelador ou ainda, por assistir a mãe que chora ao saber que o filho irá para a cadeia; tudo isso, torna-se uma interminável rotina. Assim, depois de alguns anos, pouca coisa realmente me comove quando estou exercendo a profissão. É o mal necessário que nos ajuda a não ser afetado pelo desenrolar da maior parte das histórias que aqui compartilho.
Contudo, às vezes somos pegos de surpresa. E foi numa dessas que tomei conhecimento do assassinato do irmão de um amigo, justamente na cidade onde trabalhava.
Não estava de serviço no momento, porém a família, naturalmente desesperada, pediu a minha ajuda para tentar “agilizar” a liberação do corpo e, principalmente, descobrir a autoria do crime. Eles queriam entender o que iria acontecer justamente no momento em que eu também estava abalado.
Aí experimentei o outro lado, tentando usar das influências profissionais para tentar minimizar tamanha dor. Tive empatia, fui até o IML, conversei com quem pude e, depois de muitas e muitas tentativas, no final não consegui acelerar nada. Foi só mais um corpo, mais um caso atendido, como todos os demais que deram entrada naquele plantão. O próprio sistema tratou a situação como “mais uma”, da forma que deveria ser.
E me deparei com esse método, suas inúmeras falhas, desacertos, sua morosidade. Foi terrível saber que, ainda que quisesse, não tinha super-poderes ou qualquer vantagem, mesmo que fosse um policial, fui tratado sem nenhum privilégio. Mais aterrorizante ainda foi questionar meu amigo sobre as circunstâncias do crime e ouvir dezenas de perguntas sobre o procedimento ou o que poderia ser feito, tendo que investigar aquilo. Além de consolá-lo, precisava oferecer respostas, descobrir o assassino, pensar em coisas que geralmente não faço. Ao menos não com pessoas que conheço, que convivo. E essa foi só a primeira das estranhas experiências desse tipo.
Passado tudo, mais uma vez retorno à velha questão. O que torna um policial e os que exercem as leis diferentes dos demais? Quando eu seria um policial ou cidadão? Havia perdido essa divisão?
Novamente, me vi num lugar que não queria estar e questionei no mais profundo do meu íntimo, se tinha escolhido a carreira certa e também, se ainda havia tempo de mudar caso a conclusão fosse negativa. Mas a questão toda é muito mais complexa do que responder com um sim ou não.
Ah, como eu queria ser um super herói, igual ao dos quadrinhos, e no final, dizer que salvei o dia. Mas não... Sou mais um refém desse sistema caótico, hipócrita e que está completamente falido. Nós questionamos, mas não agimos. Acatamos o injusto, não manifestamos, e tudo permanece do mesmo jeito. E isso vale tanto pra quem executa quanto é executado pelas leis.
Essa é a minha forma de gritar, e pedir socorro a sociedade para acordar desse sono, da apatia. Lembre-se que tudo isso é nossa culpa. E de mais ninguém.
Mas ainda sim, registro que eu queria que tudo fosse diferente, muito diferente.
Blog de um escritor sem compromisso, que narra contos, confusões e histórias de uma não tão pacata delegacia.
sábado, 20 de agosto de 2011
Pego de surpresa pelo crime
sexta-feira, 5 de agosto de 2011
Tentativa de homicídio contra o Príncipe Fabiano de Carvalho
Eu não trabalho com roteiro de filmes, mas devia. Na verdade, sou escrivão de polícia e você já deve saber disso. Porém no meu trabalho, quase sempre lido com situações que poderiam facilmente parar nas telas de cinema.
No último final de semana, por exemplo, tentaram matar a queima roupa o Príncipe Fabiano Carvalho. Sim, o registro geral (RG) dele era escrito dessa maneira. E olha que o sujeito não era filho de reis, duquesas ou qualquer outro desses que tem ligação com a realeza. Na verdade ele era afro-descendente (pra não discriminá-lo, ok?), pobre e devia certa quantia a um dos chefes de uma famosa “boca”, portanto carregava o título de príncipe apenas no seu nome e mais em nenhum outro lugar.
A verdade é que ouço muitas celebridades e, às vezes, é difícil lidar com isso. Muita gente famosa já sentou e prestou depoimento pra mim.
Certa vez, Michael Jackson de Oliveira teve seu fusca azul furtado e teve que falar comigo.
Já conversei também com Jesus Cristo Júnior Prates, uma figura e tanto. Foi autor de um assalto a mão armada e já tinha cumprido pena anterior por latrocínio (homicídio seguido de morte). Incrível como o sujeito era detalhista e maquiavélico!
Outro dia teve também um garoto chamado Imel da Silva Arroba, que foi “SPAM”cado pelo pai, se é que você me entende, rsrs.
Já ouvi um Maradona, mas não me recordo seu sobrenome, quando certa vez ele foi violentado sexualmente e eu ainda trabalhava noutra delegacia. Ele era magro, boa pinta, mas não jogava futebol. Definitivamente não tinha nada a ver com aquele outro famoso argentino.
Se pudesse, queria ter ouvido a Amy Whinehouse. Ah, com certeza ela teria sido uma conduzida por embriaguez no volante ou por tráfico de drogas. Que Deus a tenha, coitada.
Só sei que me divirto.. Apesar da maioria do tempo estar atolado de serviço ou lidando com histórias caóticas e que deveriam me deixar triste, eu procuro dar muitas risadas.
Mais uma daquelas, que pretendo contar pros netos ou para os amigos, sabe?
Abraços aos queridos leitores.